1. |
o animal que há em nós
03:20
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O animal que há em nós
Dessas ceias de pessoas feias...
retenho a tua cara de asno,
a rir que nem um porco,
a comer que nem um abutre,
e babavas-te que nem um camelo,
enquanto te metias com a vaca ao teu lado.
essa cadela.
Qual camaleão mimetizando um pouco de todos, comia-vos a todos.
e os javardos, felizes e contentes
que nem babuínos excitados a espumar da boca...
nem mesmo as gralhas aguentaram o pavoneio dessa pega rabuda
foram-se embora
e vocês façam o ninho bem longe de mim
nem quero ver.
meto-me já na minha toca, escondo-me na toca
foge que o animal está à solta... dentro de nós... à solta.
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2. |
mar
02:38
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Mar
mar...
cheira a mar
mar...
quero o mar
e se as costas me doem
é porque daqui não vejo peixe no mar
daqui não vejo o mar
tanto mar
mar...
sinto o vento a vir
e no mar crescem ondas ...grandes ondas
sinto o vento a vir
o vento a vir do mar
no outro dia,
do mar já não vem nada
é que aqui não se passa nada
e “mar”
já não me diz nada.
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3. |
navegadores de recreio
03:18
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Navegadores de recreio
tu pá... põe-te na alheta
pode ser na de bombordo que eu não me importo
tu pá... sai-me da frente do vento,
não vês que eu quero navegar
aliás, a gente quer navegar
aliás, todos queremos navegar
então sai-me da frente do vento
o que a gente quer
o que a gente quer é
o que a gente quer é que esta barca siga
que a barca siga...
cantamos os sons de lá para cá
e de cá para lá... cala-te boca
e ia lá
não fosse o leme estar partido e o vento levar-nos conforme quer
deixa lá o que não falta é tempo
e o tempo tanto vento que tempo tem
e com as ondas, as nossa ondas...
e com as ondas, as nossa ondas...
chegámos a bom porto!
levas com o remo na tromba
dou-te a comer aos tubarões
levas com o remo na tromba
dou-te a provar aos tubarões
naufragámos numa ilha deserta
nunca mais daqui sais
diz adeus à estrela do Norte
aqui há dois sóis
esquece as aguas calmas
ficamos por aqui
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4. |
sagres
05:11
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"Sagres"
o nevoeiro que trago na cabeça
vem cá para fora em forma de bola
cada uma mais espessa que a outra
dizem que é do fumo do tabaco que fumo
mas eu acho que é do fumo do mundo a arder
não do fumo do tabaco que fumo
é mais do fumo do mundo a arder
do perfume do mundo a arder
contudo há sempre a hipótese de se tratar de um curto circuito
dizem que se dispersa como vento Norte
mas eu sinto-o a abraçar e não me quer largar
pelos vistos não me quer largar
nem com o vento do norte se dispersa
o mundo acaba aqui
onde a água dura em pedra dura
tanto bate até que cura
cura-me o ânimo
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5. |
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"Escafandro"
Caminhei pela ribeira do lixo
Até que toquei no lodo macio
Caminhei pela ribeira do lixo
Avancei no lodo macio
Agasalhado pelo calor da certeza do escafandro umbilical
Desbravando a floresta dos detritos
Encontrei um canavial
E assim encalhado num bar
Diante dum copo vazio
Conversando com rãs
Falei-lhes do lodo macio e de como passeei com o escafandro que me deste
Agasalhado pelo calor da certeza do conforto umbilical
Resgataste-me da floresta dos detritos
O teu pescoço é o meu anzol
Passeei com o escafandro que deste
Passeei com o escafandro que deste
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6. |
agosto
04:46
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"Agosto"
ó preguiça
teimosa preguiça
pendurada dum galho
a preguiçar
esparramada num galho
a preguiçar
a preguiçar preciso de ar e...
viver uns anos na província
ó preguiça
teimosa província
teimosa preguiça
pendurada dum galho, sofá
esparramada num galho, sofá
a praia é montra, é feira, é fogo.
de resto tudo é nítido demais
sofá
longe do ego, longe das saias
e dessa maldita selva
esquece o tempo
o tempo aquece
(deixar tudo para a última da hora)
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7. |
piano
02:25
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"Piano"
Ela mordia o piano
que a tentava comer de noite
e rolava na cama
para não ter amanhã o dia de ontem
e a desconstruir cidades no motor que a leva às costas
leva também outras tantas
caras de caso
ele mordia o comboio
que o fazia correr à noite
e rolava na cama para não ter de amanhar o dia de amanhã
e a deambular na cidade
no rumor matinal das máquinas
ela entre as caras e ele entre as gentes
caras de caso
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8. |
tens tempo
04:05
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"Tens tempo"
Só eu sei como me sinto
sinto-me bem aqui contigo
ninguém disse que ia ser fácil
já sabias que ia doer
e se a alguém parece fácil
logo irá saber
que enquanto suavas na cama à noite
pensavas na tua vida à noite
mais tarde ou mais cedo
tinhas de olhar para ti
foi tarde e alguém teve de olhar por ti
vais ver que ainda tens tempo para muito
resta saber até que ponto estás disposto
a mudar os teus hábitos à noite
ai a noite...
mais tarde ou mais cedo
tinhas de olhar para ti
foi tarde e alguém teve de olhar por ti
foram dias a soro
e quando há males que vêem por bem
são dias a soro, muitos dias a soro
tens a chave da tua morte mas nem sequer estás às portas da morte
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9. |
assunto sério
02:51
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"Assunto Sério"
Senta aí, bebe outro copo
Temos muito para falar
Esquece as horas desta hora
E em falar da demora
Que transportas no olhar
Chega aqui, puxa a cadeira
Não passou tempo nenhum
Eu não tenho feito nada
Tu ris-te e achas piada
Sei de cor e devagar o teu corpo
As tuas falhas, essas linhas, as muralhas
Que eu trepava e num instante
Te oferecia o meu domingo
Como se fosse importante
Moro do outro lado do mundo
Tu vieste nem sei de onde
Do lado morto da luta
Sem bandeira ou poesia
Nem sei como começou
Agora é fogo, agora é mar o teu corpo
Essa memória, o sorriso, a velha história
Que eu cuidava e num instante
Te oferecia o meu domingo
Como se fosse importante
Estamos perto, e de repente
Tenho o corpo em alvoroço
Dizes: "está mas é calado,
Não há nada para falar"
Agora é fogo, agora é mar o teu corpo
Essa memória, o sorriso, a velha história
Que eu cuidava e num instante
Te oferecia o meu domingo
Como se fosse importante
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10. |
viagens de carro
03:19
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"Viagens de Carro"
sobre a incapacidade para organizar o tempo que tenho
sinto-me com autoridade para discutir o assunto
mas prefiro dormir sobre o assunto
prefiro dormir...
todas as noites, imagino conversas comigo
todas as noites, falamos de tudo um pouco
todas as noites, e ainda bem que é só comigo
todas as noites, há coisas que resolvo sozinho
depois há as viagens, as viagens de carro
os esporos dispersam, nas viagens de carro
cresce-me musgo, nas viagens de carro
atrás das orelhas
sobre o nervoso miudinho que me faz querer sair daqui
até tenho vontade de discutir o assunto
mas prefiro dormir sobre o assunto
prefiro dormir...
todas as noites, sorrio com medo àqueles
todas as noites, que me topam há já algum tempo
topam-te bem, mas mantêm-se ao longe
topam-te bem, fizeram a escolas juntos
depois há as viagens, as viagens de carro
os esporos dispersam, nas viagens de carro
cresce-me musgo, nas viagens de carro
atrás das orelhas
A floresta na minha cabeça, invade-me o peito
e mergulha fundo, no fundo do meu umbigo
cuspo bolas de pêlo
e limpo a boca com as costas das mãos
e depois... há as viagens, as viagens de carro...
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11. |
eu no muro
02:12
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"Eu no Muro"
Agora vou-me levantar, vestir, comer e pôr-me a andar
que já se faz tarde, muito tarde, são três da tarde.
...E eu para aqui a sonhar com dois bois...
já se faz tarde, muito tarde
...ainda agora era dia e caiu a noite...
eu vi um traço no muro
eu vi um traço no muro
eu vi...
deixei-me ficar, para ver onde é que isto ia dar,
e não vai longe, tal como eu não vou longe,
...e pensar no que fomos os dois...
não vou longe, nada longe,
...vou esquecer os tais planos para depois...
entrei para dentro do muro
entrei para dentro do muro
e lá fiquei...
emparedado no tempo
a ser comido por dentro.
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